"Quando não nos rebelamos contra as atrocidades do outro, permitimos que a crueldade permaneça, que as mentiras prosperem e que estes atos se banalizem."
Como Controlar As pessoas Pelo Medo
O medo é um sentimento atávico. Como ao rato na “Pequena Fábula” de Kafka, o medo nos impulsiona para frente, na ânsia de dele fugirmos, ou entendermos a sua causa. Do medo, nasceram a religião e a ciência. Duas formas de se interpretar o mundo e, a partir delas, encontrar algum conforto. Mas, se o medo é uma mola propulsora, ele assim o é porque o seu reverso é a coragem. Como dizia Montaigne, só há coragem onde existe medo. Aquele que não sente medo, não pode ser corajoso e será dito temerário, um louco rumo ao precipício. Todos temem, seja o medo da morte ou do desconhecido; até mesmo a felicidade é temida. Talvez tenhamos medo dela porque tememos perdê-la, receamos experimentá-la e, depois, não suportar mais viver na ausência dela. A alegria suprema de ser pai, por exemplo, vem acompanhada pelo medo sobre o destino daquela criatura tão querida. Em nossa sociedade violenta e de punição duvidosa, temer é quase somente o que nos resta a fazer. É com medo que vivemos nosso dia a dia, e assim podemos nos tornar heróis de nossas existências, vencendo nossos medos cotidianos. O medo é ainda uma forma de manipulação. George W. Bush usou-o para justificar sua política belicista contra o terror. Pelo discurso do medo, seu governo restringiu liberdades no território norte-americano, invadiu o Iraque e praticou torturas em Guantánamo. Graças ao medo do comunismo, difundido entre a classe média brasileira, nossos militares, apoiados pelos privilegiados de sempre, impuseram a ditadura por mais de duas décadas. O mesmo discurso ajudou na eleição de Collor de Melo à presidência. É, pois, em razão do medo que, por diversas vezes, paralisa a capacidade reflexiva, que discursos como estes frutificam. E é o que vemos agora quando a imprensa nos bombardeia diariamente com notícias sobre a gripe suína, estampando nas primeiras páginas dos jornais o número de mortos até o momento. Vemos então o pânico se difundir, e esquecemos que a tal gripe não se mostra mais letal do que as gripes já conhecidas.. Esquecemo-nos de que a dengue mata muito mais, de que o estado dos hospitais públicos, em várias partes desse país, é muito mais letal do que qualquer nova gripe. Mas, o medo transforma-se em notícia e ajuda a vender jornais ou a segurar a audiência.